terça-feira, 10 de novembro de 2009

MUNICÍPIO E VEREADOR QUEREM “DOAR” 76.000 M2 QUADRADOS EM ÁREA NOBRE PARA EMPRESAS PARTICULARES

"Autores do projeto afirmam que isto vai gerar 300 empregos. O custo da área é avaliado por baixo, em R$ 760.000,00. O texto é longo, mas está bem explicadinho"

Socialismo às avessas - Nada como um dia atrás do outro para comprovarmos a “ideologia” dos nossos representantes. Não faz muito tempo, o vereador Darci Andreassa subiu ao púlpito da Câmara para dar um sermão que soou de forma agradável aos fiéis reacionários da elite brasileira: desceu a borduna nos Sem-Terra naquele episódio aonde representantes daquele movimento social haviam derrubado os pés de laranja plantados num terreno que havia sido “grilado” do Estado pela empresa Cutrale (empresa que exporta 95% do suco dos seus laranjais para o exterior. O julgamento do "grilo" corre na justiça). E para quem não entende o que é “grilado”, explicamos logo que “grilado” quer dizer “roubado”. Pois bem, Darci Andreassa fez coro à grande imprensa dominada pela elite brasileira, porque onde já se viu “invadir” terra dos outros. Afirmou que o lugar de gente que invade terra e depreda o patrimônio particular é na cadeia. E apesar de não concordarmos exatamente com o método pelo qual o MST fez o seu protesto, ou seja, derrubando os pés laranja, entendemos que nosso país tem uma dívida histórica com a Reforma Agrária ( que já foi feita até no Japão que só tem montanha, e ainda cima por um general Norte-Americano. E aqui, em nosso país, a tal da Reforma Agrária não andou um milímetro desde a época das Sesmarias). Então, cheio de razão, Darci Andreassa levantou a cabeça e, imaginando-se o Messias encarnado, pretendeu expulsar os vendilhões do templo sagrado da propriedade particular. O compadre e a comadre que estão lendo, aguentem firmes, porque este “causo” é dos bons e vocês já vão ver aonde vai dar. Acontece que o discurso do Darci Andreassa só serve para quem vive debaixo das lonas pretas, passando fome e pedindo um pedacinho de terra para plantar, e correndo o risco de levar um tiro na cabeça por não ter aonde cair morto. Mas perguntamos: o que merecem, senhores e senhoras, empresários que se apossam do Patrimônio Público, depredam o que receberam de graça e depois ainda querem lucrar com isso? Será que também merecem ir para a cadeia? Que merecem ser escorraçados? Que merecem ser esculhambados por toda a imprensa e pelos políticos? Perguntamos isto, porque a empresa de Postes Cavan S/A, recebeu de graça, da Prefeitura, no ano de 1975, a “modesta” área de 76.000 m2 logo ali na entrada do bairro Itaqui. Com a permissão do Executivo e o consentimento da Câmara, através da Lei 302, a empresa recebeu este patrimônio, que foi comprado à época, pela Prefeitura, pelo valor de CR$ 240,000,00 (duzentos e quarenta mil cruzeiros - quanto daria isto hoje, em valores atualizados? Um dinheiro que saiu dos cofres públicos, do bolso de todos os contribuintes. Quer dizer, você ou seu pai, todos nós, pagamos para a Prefeitura dar um terreno para uma empresa particular). Bom aí a Cavan usou parcialmente o terreno e parece que não foi muito bem das pernas (porque, segundo dizem, também vivia das licitações da prefeitura, ou seja, dependia do Estado), depois abandou tudo lá, com o imóvel em ruínas e sem maiores explicações, há pelo menos vinte anos. Ah, claro, deixou um caseiro, que não sabia ao menos, segundo o vereador Darci, aonde os proprietários-empresários moravam.

Lei dos ricos X Lei dos pobres - Então, precisamos que o judiciário diga, neste país, qual lei vale mais: a lei dos pobres ou a lei dos ricos? Porque tem um cláusula na Lei 302, em seu Artigo 2º, que diz que a empresa não pode vender o terreno sem o consentimento do doador, que é a Prefeitura. Apesar do jurídico da Câmara não querer entender o artigo, sabe-se lá por qual razão, qualquer leigo entende. Vejam o que diz o Art. 2º da Lei 302, de 22 de outubro de 1975 (o trecho grifado e o negrito são nossos):

“Art. 2º. A donatária, no imóvel objeto da liberalidade, devera efetuar as instalações de suas atividades industriais, no prazo de l (um) ano, sob pena de revogação da doação; e não poderá aliená-lo, parcial ou totalmente, sem previa autorização do doador, e no caso de dissolução da sociedade, falência ou concordata, o imóvel revertera ao Patrimônio Municipal”.

Bom, acontece que esta Lei foi reeditada pela Prefeitura, com a anuência da Câmara de Vereadores, no ano de 1979, mas continuou com seu Art. 2º , com pequenas alterações. E por que a Lei foi reeditada? Ao que tudo indica, porque passado quatro anos, a empresa não tinha cumprido sua parte no trato. E isto já era motivo para quebrar o contrato, mas o que fizeram os vereadores da época? “Ah, vamos ajudar a coitada da empresa, que pode gerar empregos, que isto e aquilo”. Até imaginamos os discursos que fizeram para justificar a burla da licitação, que devem ser parecidos com os que estão sendo feitos agora por alguns vereadores. Mas enfim, veja o que diz o citado e reeditado Art. 2º da Lei 460, de 18 de outubro de 1979 ( grifo e negrito nossos):

“Art. 2º. A donatária, no imóvel objeto da liberalidade, deverá efetuar as instalações de suas atividades industriais ou recreativas para seus empregados, no prazo de 3 (três) anos, sob pena de revogação de doação e não poderá aliená-lo, parcial ou totalmente, sem prévia autorização do doador, e no caso de dissolução da sociedade,. falência ou concordata, o imóvel reverterá ao Patrimônio Municipal”.

Com exceção de um ponto e vírgula, e com o aumento do prazo para três anos para a empresa “efetuar as instalações de suas atividades industriais ou recreativas para seus empregados”, a Lei continuou praticamente a mesma. E fizeram a lei para beneficiar a empresa Cavan, incluindo aí a área “recreativa” para que a coisa não ficasse tão ruim perante a opinião pública, deduzimos, já que a empresa não havia ainda, pelo jeito, feito nada que justificasse a doação do terreno. Bom, independentemente se a empresa não teve a dissolução da sociedade, nem entrou em falência ou concordata, o fato é que a empresa não poderia fazer o que quisesse do terreno porque a Lei diz taxativamente que ela não poderia aliená-lo (vendê-lo) , parcial ou totalmente, “sem prévia autorização do doador”. E quem era o doador? Ora, como já dissemos, a Prefeitura, ou o povo de Campo Largo. Mas porque estamos explicando tudo isto? Calma, compadre, calma comadre, já vamos chegar lá. É que agora chegou um projeto na Câmara, o Projeto de Lei 064/09 (do Prefeito e Darci Andreassa) que se baseia exclusivamente nestas duas leis citadas acima, e só nelas, para que este terreno de 76.000 m2, que fica ali logo na entrada do Itaqui, seja novamente “doado” até o fim da vida, para outras duas empresas, a Procópio Embalagens LTDA e a Blocaus Pré-Fabricados LTDA.
E esta gente que faz lei é prá lá de esperta, porque vejam o que colocaram no cabeçalho do texto, para “induzir” os vereadores a não questionar nada (o grifo e o destaque são nossos):

PROJETO DE LEI Nº 064/09
Súmula: “Autoriza o Poder Executivo Municipal de Campo Largo a concordar com a transferência bem imóvel outorgado, através de Doação, à Postes Cavan S/A, para as empresas Procópio Embalagens Ltda e Blocaus Pré-Fabricados Ltda, conforme especifica”.


É gente, advogado, político, é gente esperta. Vejam a palavra: autoriza... a “concordar”. Êta povo esperto. Quem será o autor desta maravilha? Escreveram assim, ó, como se não fosse necessário, é só concordar. Concorda ou não concorda?

Subestimando a inteligência – Bom, compadre e comadre, aí entra o advogado da Câmara, o simpático Doutor Nelson, no gabinete do outro Nelson, o Nelsão, o do povo, que não é doutor. E a gente olhando para ver no que dava. Aí o Dr. Nelson, que é doutor, homem entendido de leis, que sabe que o Ministério Público não dá parecer, afirma, com convicção: “Não, a coisa já está toda resolvida. O Município nem é mais dono do terreno. A Câmara só tem que concordar”. Só que a coisa não é bem assim, e o pessoal tem que parar de tratar os vereadores e vereadoras como crianças, para não dizer ingênuos. Isso pega mal. Estamos em pleno Século XXI, e não tem mais ninguém bobo por aí. E o Nelsão, o que não é doutor, foi logo dizendo: “Bom, mas se não depende da Câmara, se o terreno já é deles, porque precisamos votar alguma coisa? “. É engraçado ou não é?

E pasmem, doutores e não doutores: afirmaram que a tal da Cavan até já vendeu o terreno para as empresas citadas. Ué, mas e como é que ela podia vender alguma coisa que nem era dela? Aonde anda a Procuradoria do Município que não defende os interesses do povo de Campo Largo? Porque a Lei diz claramente que ela não podia vender. Mas disserem que vendeu, e depois, retificaram, que "está vendendo". E quem foi o intermediário desta transação? Ora, quem? Algum corretor de imóveis também prá lá de esperto, porque segundo o vereador Darci, ele saiu de cena, já que só estava interessado no bem da comunidade para gerar empregos. Mas quer dizer então que uns pobres coitados não podem ter o seu pedaço de terra para poder plantar para comer, mas os grandes empresários podem usar e abusar do que é do Estado, podem vender o que não é seu, e o Município convida os vereadores e vereadoras somente a “concordar” com tudo isto? E, segundo eles, não que precisassem dos vereadores, porque, como disseram, nem precisavam porque o terreno já não é do Município. E se não precisavam, porque os vereadores tem que votar alguma coisa? E de onde se tira que o Estado tem que dar alguma coisa de graça para quem quer que seja? Não viram aí como foi o governo Lerner, que deu as estradas para as “coitadinhas” das concessionárias? Afinal, pelo discurso contra os movimentos sociais, será que é legítimo dar as coisas para os outros de graça? Não está errado dar terra para os pobres, dar bolsa família, dar isto e aquilo e não exigir nada em troca? E para os ricos, o Estado pode dar tudo? Aliás, é até obrigado a dar, se não eles não vêm gerar empregos? Eles fogem assustados quando o Estado não dá nada para eles? E que tipo de empresas são essas que não sobrevivem a não ser se for às custas do Estado? Uma empresa que não pode nem comprar um terreno para instalar uma empresa, merece confiança? Então, estamos no tempo errado, porque antigamente empresa era empresa e estado era estado. O que é do povo é do povo , e o que é particular é particular. E quem não tem competência no livre mercado, que não se estabeleça. O Estado não deve interferir em nada, aliás, deve sim, deve ajudar quem de fato precisa.
E todos não celebraram a queda do Muro de Berlim, porque diziam que o Estado dominava tudo, que o Estado dava terreno para os pobres, e que isto era uma ditadura? E de fato era. E agora, o Estado é obrigado a dar terreno para os ricos, senão eles não geram empregos? Empregos bons, de mais de mil reais, com participação nos lucros, cumprindo as obrigações trabalhistas e segurança no trabalho?

E o nosso mandato calculou, por cima, com base nos preços de imobiliárias locais, o custo daquela área: por baixo, R$ 760.000,00 (setecentos e sessenta mil reais). Porque um terreninho, de 622 m2, lá na Vila Glória, no Itaqui, está custando R$ 8.000,00. E está barato. Digamos que mil metros estejam em torno de 10 mil. Isto lá na Vila Glória, e não ali, perto da BR. Então estamos avaliando por baixo, porque pode ser que seja o dobro disso, ou seja, perto de um milhão e meio de reais. Mas será que nós estamos dando terreno para pequenos e médios empresários? Para empresas que precisam de estímulo? Não, claro que não. Você, médio e pequeno empresário de Campo Largo, pode ficar tranqüilo, que o “socialismo às avessas” nunca vai chegar até você. Para você, pequeno e médio empresário, o que a prefeitura e o vereador Darci Andreassa tem para dar, são os impostos. E o vereador Sérgio Schmitd afirmou que a tal da Blocaus tem um capital social (“dim-dim”) oito vezes maior do que a Procópio, e isto justificaria a doação do terreno. Então a lógica é essa, é o “socialismo às avessas”: tirar de todos os contribuintes e dar para os ricos. Quanto mais rico for um cabra, mais o Estado tem que dar vantagens para ele. Quanto mais pobre, mais o Estado tem que tirar dele.

Resumo da ópera - O vereador Nelsão pediu que fosse deixado no local, onde supostamente serão instaladas as novas empresas (e alguns já dão o fato por consumado), pelo menos um simples campo de futebol para uso da comunidade. Um pedaço do terreno que não dá nem ao menos 4 mil metros. E aí, o presidente da casa, o vereador Sérgio Schmitd caiu de pau em cima, dizendo que é melhor gerar empregos do que ter campo de futebol. E o vereador Darci Andreassa afirmou que os proprietários da Procópio disseram que o campo de futebol era “o filé mignon” do terreno. Que ele, Darci, havia praticamente suplicado para a empresa Cavan o campo de futebol para comunidade e a Cavan não quis dar. Que ele tentou de todas as maneiras, mas não foi possível. E perguntamos: e que empresa é esta, que recebeu 76.000 m2 de “mão beijada”, abandonou tudo, deixou o local em ruínas durante mais de 15 anos e depois se nega a devolver para a comunidade 1% do que recebeu? E ainda por cima: que empresa é esta que não cumpriu com o objeto da concessão do terreno (gerar empregos e produzir) e ainda por cima vai levar como prêmio o dinheiro da venda do terreno que não é seu? E ainda temos que ficar "de joelhos", rezando para as empresas que querem comprar o terreno não irem embora? Então vamos fazer o seguinte. Vamos pegar esta grana, esta grana da venda do terreno, e vamos investir aí nos pequenos e médios empresários de Campo Largo: vamos dividir estes R$ 760.000,00, no mínimo, ou um milhão e meio, no máximo, e ver se estes pequenos e médios empresários não geram muito mais do que 360 empregos prometidos (mas não garantidos), porque já está provado que neste país quem mais gera empregos são as pequenas e médias empresas. E mesmo os outros grandes empresários de Campo Largo e de Curitiba, como é que ficam? Porque todo mundo quer um “presente” destes.

Ordem e Progresso – E, finalmente, acima de tudo, tem a Lei Orgânica do Município, que afirma no Capítulo III, Seção II, DO USO DOS BENS, em seu

Art. 25 – “Cessão de direito real de uso é o contrato pelo qual a Administração Pública Municipal transfere a utilização remunerada ou gratuita de imóvel público ou particular, como direito real resolúvel, para fins específicos de urbanização, industrialização, edificação, cultivo ou qualquer outra exploração de interesse social, dependendo de lei autorizadora e concorrência pública”. (grifo e negrito nossos).

E veja, a simultaniedade da Lei acima: precisa de lei autorizadora e concorrência pública. Precisa das duas coisas e não uma só. E sabe aonde isto pode acabar se este artigo for descumprido? Pode acabar em improbidade administrativa. Então, meus amigos e amigas, a coisa não se trata só de concordar ou não concordar. A coisa não se trata de pedir de joelhos para a Cavan que doe o campo. O que tem que fazer é acionar a justiça. E, se como diz o nosso amigo Rubens, a coisa ficar “empacada” durante anos? Pelo menos o Município não vai dar de “mão beijada” o que saiu do bolso dos contribuintes. Os terrenos em Campo Largo estão ficando cada vez mais caros. O mínimo que o Município faz é uma poupança programada. Empresas que não cumprem com seu papel não podem sair vitoriosas de um processo desses. Qualquer juiz de bom senso vai entender que a empresa não cumpriu com o objeto do contrato. Além do mais, apesar do Dr. Nelson entender de forma diferente, as Leis citadas, aquelas das décadas de 1970, vão frontalmente de encontro com a Lei Orgânica do Município que exige, além de lei autorizativa, concorrência pública nestes casos. E o prefeito não será cassado por improbidade, por ter vendido um terreno público sem licitação. E os vereadores e o Dr. Nelson também não serão responsabilizados por isto.
Apesar do Darci Andressa estar por trás deste projeto, ele veio como sendo do Executivo, em nome do prefeito Edson Basso. Bom, e o prefeito afirmou que não havia no município áreas de interesse social para habitação. Disse que não havia terrenos para a construção de casas para pessoas simples e humildes. E agora, vem com um projeto desses, que doa uma área de 76.000 m2 para empresas particulares. Para resumir: vivemos, em Campo Largo, o socialismo às avessas. Utiliza-se o discurso de geração de empregos, quando é para dar facilidade para os ricos ficarem cada vez mais ricos. Quando se tenta incluir um simples projeto para dar cursos para os catadores de lixo, os vereadores dizem que não pode. O presidente e o jurídico da Casa dizem que é “ilegal”. Acontece que existe a Lei e a Lei tem que ser cumprida, e a Lei serve para todos. Acontece que o tempo do Estado beneficiar os grandes e excluir os médios e pequenos já passou. Acontece que a comunidade precisa de uma área de lazer. E acontece que os outros empresários de Campo Largo não vão ficar nada contentes quando souberem que não foram convidados a participar de uma concorrência, garantida por Lei, para adquirirem um terreno, ou parte de um terreno, nestas condições, apesar do “corretor social” Darci Andressa ficar um pouco chateado, já que está só pensando em gerar emprego e beneficiar a comunidade.
Se depender do vereador Nelsão, isso não passa. A não ser que se faça um lei que garanta para todos os pequenos e médios empresários de Campo Largo benefícios semelhantes. A não ser que as empresas ganhadoras deste terreno se comprometam a dar uma contrapartida social, a área para a recreação da comunidade, e garantam empregos de qualidade, se adequando a Legislação ambiental, porque nem isto o projeto enviado pelo Prefeito prevê.
E se prevalecer a arrogância dos entendimentos jurídicos, acima da interpretação sóbria e do diálogo, vamos ver o que diz o Poder Judiciário em todas as suas instâncias. Aí sim, vai demorar vinte anos e um abraço pro gaiteiro.

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